Decisão da 4º Vara Federal de Porto Alegre ocorreu após instituição se negar a homologar matrícula de candidata que preenchia critérios de ingresso
Uma decisão da 4º Vara Federal de Porto Alegre efetuada na última sexta-feira (29) assegurou a permanência de uma aluna cotista da UFRGS que estava sendo impedida de frequentar a instituição. A matrícula havia sido negada pela Comissão Recursal da universidade mesmo após a candidata ter comprovado a sua identidade racial – uma vez que é filha de uma relação entre um pai negro e uma mãe branca – e já ter cursado três semestres da graduação.
A situação iniciou em julho do ano passado, quando ela foi surpreendida com a informação de que sua homologação foi negada pela UFRGS. O motivo apontado foi a ausência da candidata à reunião de aferição da condição étnico-racial. Após conquistar na Justiça o direito por uma nova reunião, a candidata obteve a matrícula provisória até uma nova avaliação da Comissão Recursal, que ocorreu em maio de 2023.
Contudo, o grupo novamente negou a inscrição da candidata, desta vez não reconhecendo a sua identidade parda – mesmo após ela ter apresentado uma série de documentos que comprovam as suas raízes familiares e o seu histórico escolar no IFRS ocupando vaga destinada a cotistas. Os membros da comissão alegaram que “não encontraram elementos fenotípicos em seu conjunto para gerar a convicção a candidata seja destinatária desta modalidade de ingresso como pertencente à população negra”.
Diante disso, a ação encaminhada pelo Escritório Rogério Viola Coelho Advogados conquistou o direito à matrícula apontando os equívocos da comissão ao não considerar os critérios essenciais que estabelecem a Lei de Cotas no Brasil. Dentre eles, está o Estatuto da Igualdade Racial, que prevê a garantia da autodeclaração étnica racial no momento da inscrição, além de um espaço de 50% de vagas para cotistas em processo seletivo em universidades públicas.
Assim, foi concedida a chamada tutela de urgência, assinada pelo juiz federal Bruno Risch Fagundes de Oliveira, que suspende os efeitos da não homologação e assegura o direito da estudante a realizar as aulas normalmente na universidade. No despacho, ele salientou que o critério de autodeclaração parda deve prevalecer diante das evidências que comprovam a sua miscigenação racial.
Cancelamento de matrículas provisórias aumenta na UFRGS
Uma das questões que causa preocupação com relação às políticas da atual gestão da UFRGS é o aumento no número de cancelamentos de matrículas provisórias na instituição de ensino. De acordo com reportagem publicada no Brasil de Fato, somente em junho deste ano cerca de 160 alunos cotistas tiveram problemas com a matrícula.
Esse cenário motivou um grupo de alunos a acionar a Comissão de Educação da Assembleia Legislativa para denunciar os obstáculos para a formalização do procedimento. Dentre eles está o tempo escasso para a apresentação de comprovação para os cotistas socioeconômicos – somente cinco dias para cerca de 100 documentos. Além disso, existem fortes queixas com relação aos métodos de avaliação feitos de forma online.
Essa situação resulta em um embate jurídico desgastante que muitos estudantes cotistas têm que enfrentar para fazer uso de um direito que já está garantido por lei. Segundo a advogada do Escritório Rogério Coelho, Jéssica Pereira Silveira, somente no escritório foram atendidos recentemente cerca de 15 casos envolvendo o cancelamento de matrículas na UFRGS.
“A grande maioria das nossas ações são de pessoas que não conseguiram comparecer à reunião da avaliação. Então a pessoa sequer passou pela avaliação por uma formalidade da UFRGS em não remarcar a data e não entender a situação de cada um”, destaca.
Ela salienta que a falta na avaliação é um aspecto que não pode invalidar o processo de matrícula de cotistas em instituições superiores de ensino, sob pena de descumprir as diretrizes que regem o acesso à educação no Brasil.
“O direito à educação está previsto na Constituição e é muito mais forte do que uma formalidade para apresentação à UFRGS. Não teria prejuízo algum em algum outro momento a pessoa se apresentar. Não pedimos a matrícula independentemente da comissão”, afirma Jéssica.
Jornalista responsável: Marcelo Passarella (54) 9.8117.5856
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Imagem: SECOM UFRGS
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